21 de outubro de 2022

O Que Significa Raiz de Amargura na Bíblia ?

Daniel Conegero


Raiz de amargura é uma expressão que aparece na Epístola aos Hebreus para se referir a um comportamento perigoso e extremamente prejudicial à Igreja. Apesar de ser uma expressão muito comum entre os cristãos, muitos possuem um entendimento completamente equivocado sobre o que é raiz de amargura.

A raiz de amargura na Bíblia

O texto mais conhecidos mais conhecido onde aparece a expressão “raiz de amargura” está registrado em Hebreus 12:6, onde lemos:

Tendo cuidado de que ninguém seja faltoso, e se prive da graça de Deus, e de que nenhuma raiz de amargura, brotando, vos perturbe, e por ela muitos se contaminem.
(Hebreus 12:15)

Nem todos sabem, mas ao escrever essa frase, o escritor do livro de Hebreus estava de citando outro texto presente no Antigo Testamento. Na verdade o autor dessa epístola era um profundo conhecedor do Antigo Testamento, e fez uso exaustivo dele em toda sua carta.

Seus destinatários eram crentes judeus da Diáspora, isto é, que viviam fora da Palestina, e estes também conheciam bem as Escrituras através de sua tradução grega, a Septuaginta. Assim, o texto citado pelo autor, e que obviamente foi compreendido pelos seus leitores, encontra-se no livro de Deuteronômio, onde Deus, através de Moisés, exortou ao povo de Israel que não houvesse entre eles “nenhuma raiz que produza esse veneno amargo” (Dt 29:18).

Para que entre vós não haja homem, nem mulher, nem família, nem tribo, cujo coração hoje se desvie do Senhor nosso Deus, para que vá servir aos deuses destas nações; para que entre vós não haja raiz que dê veneno amargo.

Qual o significado da raiz de amargura?

A palavra amargura significa literalmente “sabor amargo”, porém no sentido figurado pode se referir aos sentimentos relacionados à angústia, ou seja, transmitindo a ideia de que a alegria é doce enquanto a tristeza é amarga.

Com base nisso, a interpretação mais popular entre os cristãos diz que a raiz de amargura é um tipo de rancor alimentado por alguém, ou seja, uma mágoa ou sentimento odioso que está no coração e que impede que o ofendido perdoe quem lhe ofendeu.

No entanto, esse não é o verdadeiro significado da raiz de amargura a qual o escritor de Hebreus se referiu. Para entendermos o que realmente é a raiz de amargura na Bíblia, basta olharmos para o texto que foi citado no Antigo Testamento, e analisá-lo à luz do contexto do capítulo 12 de Hebreus.

A raiz de amargura em Deuteronômio 29

Uma leitura simples do capítulo 29 de Deuteronômio nos revela que o povo de Israel estava sendo exortado por Deus, através de Moisés, contra o terrível perigo da Idolatria que afasta as pessoas do verdadeiro Deus.

Moisés então lembrou o povo sobre da adoração aos falsos deuses que havia no Egito, onde ídolos feitos de madeira, de pedra, de prata e de ouro eram cultuados, e como aquela prática era uma abominação diante do Senhor.

Essa advertência era muito propícia, pois o povo de Israel entraria na Terra Prometida, onde os povos que habitam aquela região também praticavam a idolatria tal como os egípcios. Então, os israelitas foram exortados para que não houvesse entre eles ninguém “cujo coração se afaste do Senhor, do nosso Deus, para adorar os deuses daquelas nações” (Dt 29:18).

É nesse contexto que Moisés utilizou a figura da erva daninha, isto é, a raiz amarga e venenosa para ilustrar a idolatria em conexão com a apostasia. Esse alerta era tão sério que o escritor enfatizou que se alguém se afastasse do Senhor e abraçasse a idolatria, achando que estaria em paz e em segurança, na verdade estaria trazendo maldição sobre si mesmo (Dt 29:19).

O que é a raiz amarga?

De acordo com a informação acima, é bem fácil entender porque Moisés recorreu à raiz amarga que produz veneno para ilustrar o que estava falando. Além do gosto horrível e amargo, esse tipo de erva daninha, quando colocada no alimento, poderia matar uma família inteira.

Além disso, as ervas daninhas prejudicavam grandemente as plantações, pois se disseminavam com muita rapidez, e prejudicavam a absorção de nutrientes das demais plantas. Assim, fora o gosto horrível e amargo dessa raiz, ela causava doença, morte e prejuízo nas lavouras.

A raiz de amargura em Hebreus 12

Vimos que o escritor de Hebreus utilizou exatamente esse exemplo dado por Moisés. Quando olhamos para o contexto do capítulo 12, podemos perceber que a raiz de amargura se encaixa perfeitamente com o tema que está sendo discutido.

O escritor da epístola estava exortando os irmãos a não desanimarem, mas apoiarem uns aos outros. Aqui vale dizer que aqueles cristãos estavam sofrendo muito. Por conta de sua fé em Jesus Cristo, eles estavam sendo perseguidos, perdendo seus negócios, tendo seus bens confiscados, sendo presos e alguns até mesmo mortos.

Diante desse cenário, constantemente eles eram pressionados a abandonar a fé e retornar ao judaísmo. Então o autor de Hebreus mostrou a superioridade de Cristo frente ao caráter temporário do judaísmo, e os instruiu dizendo que recuar não é uma opção.

No capítulo anterior (11), ele forneceu vários exemplos de pessoas que sofreram e venceram através da fé verdadeira, e no capítulo 12 ele apresentou Jesus como o “autor e consumador da fé”, aquele suportou a dor maior no Calvário (Hb 12:2-4). Depois disso, ele ensinou como os cristãos devem agir diante da disciplina de Deus (Hb 12:5-11).

Entre os versículos 14 e 17, o autor, como um pastor preocupado com a situação de suas ovelhas, escreveu aos seus leitores sobre como viver uma vida que agrada a Deus. Ele fez isso dizendo o que deve ser feito, isto é, seguir a paz com todos e a santificação (Hb 12:14), bem como o que não se deve fazer, nesse caso, negligenciar o cuidado mútuo uns para com os outros, pois essa falha representa um perigo muito grande, já que pessoas faltosas separam-se da graça de Deus e contaminam, como raízes amargas e venenosas, a comunidade cristã, trazendo consequentemente grande perturbação.

É por isso que ele aconselhou que os cristãos cuidassem uns dos outros, estando atentos para que “ninguém se prive da graça de Deus”. Como o sofrimento é um tema que está sendo tratado nesse capítulo, o escritor está aconselhando os cristãos a estarem alertas sobre como os demais estão lidando com seus problemas e sofrimentos, para que seja possível identificar alguém esteja ficando para trás, sendo faltoso, e, consequentemente, separando-se da graça de Deus.

É possível que as pessoas que o autor estivesse em mente quando escreveu esse texto fossem aquelas que diante das calamidades se revoltavam contra Deus, que se esqueciam de todas as bênçãos que já lhes foram dadas, que rejeitavam a verdade a qual foram instruídas, que negavam a fé que um dia disseram professar, que mostravam não desfrutar da verdadeira paz e, obviamente, falhavam no processo da santificação, e, ainda por cima, na sua loucura e perversidade, acreditavam estar em segurança.

É esse tipo de pessoa que se enquadra na figura da raiz de amargura. Em outras palavras, a raiz de amargura é aquela pessoa que se privou da graça de Deus, ou seja, a amargura produzida por essa raiz não é o ressentimento ou a mágoa, mas é o pecado da incredulidade e do desprezo com as coisas de Deus.

A raiz de amargura expressa o estado de rebelião das pessoas que mesmo com seus corações mergulhados na perversidade se iludem com uma falsa segurança quando buscam refugio longe de Deus.

É por isso que a raiz de amargura é tão perigosa, pois ela causa problemas dentro da comunidade cristã, gerando perturbação e podendo contaminar outras pessoas. Com seu comportamento corrompido, e suas palavras amargas, tais pessoas se esforçar para privar os cristãos da santidade.

A raiz de amargura é um veneno contagiante, que serve de canal para que o pecado se espalhe entre o povo como erva daninha. A raiz de amargura transmite o mau testemunho e o escândalo, e ridiculariza a fidelidade a Deus, assim como fez Esaú, que por um prato de ensopado desprezou sua herança como primogênito e, consequentemente, a bênção de Deus, banalizando as promessas da aliança feitas a Abraão e Isaque. É por isso que o escritor o chamou de profano (Hb 12:16).

Diante disso, podemos dizer que é fundamental que os cristãos saibam realmente o que é raiz de amargura, para que ao ser identificada, rapidamente ela seja arrancada, evitando assim que seu veneno contamine outros e seu gosto amargo se espalhe.

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