22 de dezembro de 2020

Quando incentivar o turismo com animais silvestres


Cavalo-marinho dentro de vidro para ser mostrado a turistas

Será que esse tipo de atitude não gera algum impacto para os animais?

Primeiro-tenente da PM Ambiental de São Paulo, onde atua como chefe do Setor de Monitoramento do Comando de Policiamento Ambiental. É mestrando no Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP
nalinhadefrente@faunanews.com.br

No final de cada ano, sempre realizamos uma reflexão sobre o ano que passou e as perspectivas para o novo período que se inicia, vislumbrando as mudanças necessárias para a evolução. E, sem dúvida, a proteção à fauna também deve se pautar nessa evolução constante.

Ainda mais neste ano atípico de 2020, em que comecei a perceber a forma como a fauna silvestre é utilizada no Brasil e como seu grau de proteção possuí forte vinculação às questões social e cultural, mesmo nossa legislação sendo nacional e única para ser aplicada em todo o país.

Uma das discrepâncias que observamos quando viajamos pelo Brasil está na forma como o turismo explora a vida silvestre como forma de obter uma “atração” baseada na doma ou cativeiro de animais. Encontramos exemplos em diversos locais, como os botos no Norte, os dromedários no Nordeste, aves no Sul e em quase todo o litoral com os mergulhos em áreas de corais onde peixes, crustáceos e estrelas-do-mar são retirados da água para serem fotografados pelos turistas.

É claro que a observação de animais em vida livre é a forma ideal de aliar a exploração do turismo (e não do animal) e a conservação da natureza. Mas será que de fato ela ocorre de forma consciente? Ou o que realmente está ocorrendo é uma exploração visando apenas o lucro?

Embora o discurso de todos que promovem essa utilização da fauna afirme que todos os animais não são maltratados e defenda seu bem-estar e a conservação, será que cavalos-marinhos quando são retirados da água em vidros, como em Jericoacoara (CE), para turistas os fotografarem não sofrem nenhuma perturbação? Será que não há mortes nessa coleta?

Dromedários em praia
Dromedários utilizados para passeios com turistas em Natal (RN) – Foto: Vitor Calandrini

Será que não há alteração no ciclo de alimentação ou de reprodução de peixes quando são alimentados com ração ou polvilho para as pessoas tirarem aquelas fotos bonitas como nos arrecifes de corais em Porto de Galinhas (PE) ou Maracajaú (RN)? Ou ainda é respeitado o descanso e a hidratação correta dos dromedários em Natal (RN)?

É claro que muitas pessoas buscam experiências com animais por gostar de animais, mas será que isso não está fortalecendo a mortandade ou a domesticação de silvestres e colocando, mais uma vez, a vontade humana sobre a vida e o bem-estar animal?

De fato, situações assim ocorrem porque há ainda grande procura e mercado consumidor para essas atividades e pouco se analisa os problemas decorrentes dessa utilização.
Infelizmente, as pessoas esperam que as soluções venham apenas das autoridades públicas, se esquecendo que todos somos responsáveis por desestimular essas ações e que podemos desistir desses atrativos. Essas atitudes dos turistas naturalmente levarão a uma mudança na forma de trato com os animais e diminuirão essa pressão em sobre a fauna.

Atividades que devem ser estimuladas são aquelas em que a observação da fauna ocorre com animais em vida livre e agindo naturalmente, mesmo que seja mais difícil esse contato. Mas é o natural, afinal os silvestres geralmente vivem longe dos humanos e é isso que os torna únicos e tão importantes.

Sei que este mês meu artigo pareceu muito mais uma série de perguntas do que um texto explicativo, mas afinal é fim de ano, época de repensarmos nosso dia a dia e pensarmos se não devemos “turistar” de forma diferente, sem que seja através da utilização de silvestres. Analise: o atrativo envolve animais? Então pare e veja se é uma expressão livre e espontânea do animal em vida livre ou uma ação condicionada de um humano. Se sim para a segunda opção, evite.

Bom fim de ano para você e um excelente 2021! 

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